Marco Antonio Costa

Outro dia, lendo o livro “Fazer Acontecer”, de Júlio Ribeiro, publicitário e presidente do Grupo Talent, formado pelas agências de publicidade Talent e Talent Biz, comecei a refletir sobre a seguinte frase: “O primeiro princípio ensinado nos cursos de formação de empresários e administradores deveria ser: Mantenha a empresa apaixonada.” O autor se dizia perplexo de ver como as pessoas adquirem a capacidade de fazer coisas inusitadas quando encontram-se em estado de encantamento, e isso principalmente nas empresas.

Talvez pelo fato de há alguns anos vir dirigindo uma empresa que tem como um dos seus principais produtos a organização de concursos públicos, fui levado a refletir sobre o assunto e, mais que isso, flagrei-me sonhando no que seria a administração pública se esse tal estado de encantamento “contaminasse” seus funcionários. Não precisa ser um entendido no assunto para saber que a Constituição Federal de 1988 avançou muito quando tratou do ingresso no serviço público, ainda que não tenha definido também instrumentos quanto ao não menos importante item da estabilidade. Acredito que até agora poucos tenham atentado para o fato de que o posicionamento do Congresso de 1988 foi decisivo para que não só as empresas privadas, mas fundamentalmente o serviço público como um todo tivesse plantadas as condições reais de inserção no processo de busca pela qualidade, sem o qual as empresas de um modo geral e, mais especificamente aquelas voltadas para a área de serviços, como é o caso do poder público, não sobreviverão ou não cumprirão com seus objetivos mais elementares.

É preciso que todos tenham em mente que, apesar das multas mazelas existentes no serviço público, a adoção do concurso como forma de admissão contribui significativamente para a melhoria dos quadros funcionais e por conseqüência do serviço oferecido à população. A utilização do concurso público como primeiro passo na busca pela qualidade, aliada à uma política de treinamento de pessoal, deve ser meta de todo administrador que tenha por objetivo dividir a pesada responsabilidade de gerir a organização, pois funcionários “apaixonados” transformam o ambiente de trabalho, gerando resultados surpreendentes. Tão surpreendentes, que só mesmo a irracionalidade da paixão explica.

Mas como os processos de mudança são difíceis e, muitas vezes levam anos para serem efetivamente consolidados, podemos contar com a certeza de que a semente já foi lançada. Cabe-nos, agora, fertilizá-la o máximo possível. É dessa forma que iniciativas estão sendo tomadas em todos os lugares. Pelo Poder Executivos, temos o exemplo da Secretaria de Administração da Bahia. Lá, funcionários “apaixonados” facilitam o dia-a-dia de milhares de pessoas que procuram o recém-criado Serviço de Atendimento ao Cidadão, que agrega vários órgãos em um só local onde pessoas e empresas conseguem tirar documentos, pagar taxas e resolver uma série de coisas sem a burocracia característica desses processos.

Em São Paulo, o Poder Legislativo, segundo exposição pública do presidente da Assembléia Legislativa, em recente artigo no jornal Folha de São Paulo, também pretende lançar aquela Casa Legislativa no caminho da conquista da qualidade.

Para encerrar com um terceiro exemplo, o Poder Judiciário, aqui em Pernambuco, começa a verificar sensíveis melhorias no seu quadro de pessoal, como desabafou um dia desses um alto funcionário da Justiça, em conversa informal sobre a competência e nível cultural dos funcionários lotados na instituição que comanda.

Graças a tudo isso, está cada vez mais próximo o tempo em que as repartições públicas serão exemplo de comprometimento e qualidade nos seus serviços. Indício disso é que hoje temos organizações com uma maioria de pessoas que concorreu a um concurso e que quase sempre demandou muito esforço para tanto, o que faz com que valorize o trabalho, a função e, em conseqüência, o órgão para o qual lutou para fazer parte.

Observo que com o turbilhão de mudanças que estão ocorrendo (muitas delas a nível global), onde discursos sobre processos de qualidade, estabilidade do servidor público, investimento contínuo na formação profissional e um elenco de outros mecanismos que estão revolucionando o processo de trabalho em todo o mundo, também as pessoas estão sendo levadas a mudar de postura e comportamento, pois mais do que qualquer outra coisa, trata-se de uma questão de sobrevivência, para empresas e para funcionários. É neste contexto que vejo aceso o fogo da paixão, cabe agora aos dirigentes de órgãos públicos manter a chama, aproveitando o cenário, indiscutivelmente ímpar, para tornarem seus funcionários efetivos e modernos colaboradores apaixonados por seu trabalho e pela organização.